Saiba por que empresas brasileiras o têm adotado, e qual é o impacto dele nas políticas de inclusão.
Por Rodrigo Miranda
Diversidade, igualdade e inclusão são temas cada vez mais em alta e têm sido relevantes e essenciais para todos os setores da sociedade. Por isso, no contexto laboral surgiu um novo modelo de contratação que é anônimo, conhecido como recrutamento às cegas.
O método consiste em omitir a identidade do candidato durante as primeiras etapas do processo seletivo. Todas as informações pessoais que poderiam gerar preconceitos — como nome, idade, gênero, etnia e endereço — são ocultadas até o final da seleção.
O principal objetivo do recrutamento às cegas é eliminar ou ao menos diminuir os vieses inconscientes que frequentemente influenciam o processo de seleção de candidatos. Vieses como racismo, misoginia, etarismo e outros preconceitos podem influenciar negativamente as decisões dos recrutadores, prejudicando candidatos talentosos e competentes.
Segundo Neidy Christo, administradora e presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos – Seccional Espírito Santo, o conceito não é novo. Mas a aplicação e a conscientização sobre a importância da diversidade e da inclusão têm aumentado significativamente, nos últimos anos, à medida que mais empresas reconhecem os benefícios de uma força de trabalho diversificada e buscam práticas de contratação mais justas.
“Essa tendência é impulsionada pela necessidade de promover a diversidade e a inclusão nas organizações. Embora algumas empresas já adotem essa abordagem, ainda há espaço para evolução e conscientização sobre os benefícios do recrutamento às cegas: a implementação pode variar dependendo do setor, tamanho da empresa e cultura organizacional”, explica a administradora.
Benefícios
Os resultados do recrutamento às cegas têm sido bem recebidos pelos stakeholders das empresas que adotam o método. Colaboradores, clientes e investidores veem a política de contratação como uma forma concreta de comprometimento com a diversidade e inclusão, o que pode melhorar a imagem e a reputação das organizações.
Ao optarem por esse tipo de contratação, as instituições despertam maior sensação de pertencimento e confiança no ambiente de trabalho, resultando em maior produtividade e engajamento. Para Elcio Teixeira, CEO da ‘Heach Consultoria em Gestão de Pessoas’, as empresas já estão atentas a tais mudanças e têm buscado transformar o ambiente de trabalho para ampliar as opções de candidatos.
“Diversas empresas já estão buscando diversificar suas equipes e evitar qualquer tipo de viés que atrapalhe o processo de contratação, por isso elas ampliam seus programas de diversidade e inclusão. Com um nível maior de maturidade, esses vieses são drasticamente reduzidos”, diz Teixeira.
Experiência
Empresas têm relatado resultados positivos ao adotar o ‘recrutamento às cegas’. Um exemplo vem da rede de hospitais Sírio-Libanês, que aplicou o modelo como teste entre agosto de 2022 e março de 2023.
De acordo com dados fornecidos pelo próprio hospital, dos profissionais contratados durante o período, 90% foram mulheres, 51% pessoas negras, 30% da comunidade LGBTQIA+, e 10% com mais de 50 anos de idade. Neidy Christo afirma que a implementação do recrutamento às cegas pode trazer vários impactos positivos para o ambiente corporativo e para a imagem da empresa.
“Ao eliminar vieses inconscientes durante o processo de seleção, as empresas têm a oportunidade de avaliar os candidatos com base em suas habilidades e méritos, em vez de fatores irrelevantes. Isso ajuda a promover a diversidade e a inclusão; além disso, o recrutamento às cegas pode melhorar a reputação da empresa, atrair talentos de alto nível e aumentar a satisfação dos empregados”, diz a administradora.
Greenwashing
De olho no crescimento e inovação, a tendência é que mais empresas adotem o modelo. Entretanto, fica um alerta para avaliar se os motivos que levam as empresas a implementarem o modelo são parte real de sua política institucional ou uma falsa ação de marketing, denominada greenwashing.
Para evitar falsas ações mercadológicas, mascaradas de ESG, os stakeholders devem checar se as empresas seguem práticas como: revisar e atualizar os processos de recrutamento existentes e utilizar plataformas de recrutamento que possuam recursos específicos para ‘cegar currículos’. Devem, ainda, verificar se as instituições garantem que a avaliação seja feita com base nas habilidades e experiências relevantes e na capacitação dos recrutadores.
Para Teixeira, tanto nas ações afirmativas quanto no greenwashing a tecnologia é uma grande aliada no quesito checagem e facilitação. Ela pode acelerar todo o processo seletivo e ainda auxiliar no mascaramento das identidades dos entrevistados.
“A tecnologia e a inteligência artificial já fazem parte da rotina das empresas de recrutamento e de boa parte das demais instituições. À medida que as restrições demográficas deixam de ser critérios essenciais, os processos seletivos tendem a ser muito mais rápidos, com muito mais candidatos e muito mais assertivos”, finaliza.