Com seis milhões de vagas no mercado de trabalho e faturamento anual na casa dos R$ 166 bilhões, a gastronomia é uma excelente oportunidade para os profissionais de administração
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O mercado da gastronomia no Brasil não para de crescer. Nos últimos 15 anos, o mundo voltou os olhos para este país que, desde então, tem apresentado chefs que se consagraram, tanto aqui como no exterior. De acordo com a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), são mais de 1milhão de estabelecimentos funcionando. Mas não se engane: o número de negócios que fecham as portas todos os anos também tem sua grandeza. A Abrasel estima que 35% de bares e restaurantes encerram suas atividades nos dois primeiros anos de funcionamento. A causa para este efeito é a falta de conhecimento administrativo. Nesses casos, o administrador pode ser o fator de sucesso.
Os números desse mercado são imponentes. É a única atividade comercial que está presente, literalmente, de norte a sul, leste a oeste do Brasil, nos seus 5.570 municípios. Segundo a Abrasel, o faturamento em 2017 foi de R$ 166 milhões; para este ano, a previsão é ainda maior: R$ 180 bilhões. O setor é responsável por seis milhões de empregos diretos (metade do gerado pela Indústria do Turismo) e representa hoje 2,7% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.
Uma série de fatores contribuiu para o crescimento exponencial do mercado da gastronomia no Brasil, de acordo com o diretor de Desenvolvimento da Abrasel, Lucas Rêgo. O executivo destaca as atribuições profissionais que aumentam na velocidade da tecnologia, além de um grande trabalho de comunicação em torno do assunto, entre outros pontos.
“Aqui no Brasil temos o hábito de acordar e dormir assistindo programas culinários na TV. A dificuldade de contratar empregadas domésticas também entra nessa conta. Hoje, a maioria dos serviços domésticos é assumida por diaristas – que geralmente não cozinham – ou divididos pelos membros do lar. Some isso ao bom momento econômico experimentado pelo país há alguns anos e temos um número cada vez maior de pessoas se alimentando fora de casa”, exemplifica Lucas.
Quando nos aproximamos da realidade desse mercado, os problemas encontrados são inúmeros. O maior deles, sem dúvidas, é a falta de gestão e conhecimento administrativo, de acordo com Lucas. Para o diretor de Desenvolvimento, muita gente ainda associa o fato de gostar de comer fora de casa e saber cozinhar com montar um novo negócio.
“A gestão de um negócio que mexe com processamento de alimentos tem dificuldades como qualquer outro, mas a legislação deste mercado não é como em qualquer outro. As questões legais obrigam o empreendedor desse ramo a se especializar e estar sempre estudando, para evitar falhas básicas que possam comprometer o seu sucesso”, avalia.
A Academia, pelos números, vem fazendo a sua parte e aumentando, ano a ano, a quantidade de vagas ofertadas para quem quer se graduar em Gastronomia. De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), autarquia federal ligada ao Ministério da Educação (MEC), em 2016 foram quase 28 mil alunos inscritos no curso de Gastronomia. Os cursos de graduação unem prática e teoria, mas boa parte da grade obrigatória do MEC é voltada para gestão – inclusive, com muitas cadeiras do curso de Administração.
Lucas Rêgo, da Abrasel, corrobora esses dados e afirma que o papel do administrador no ramo de alimentação tem importância igualitária com, por exemplo, o Chef de cozinha. “Saber cozinhar, sim, é fundamental. Mas acima de tudo é preciso administrar o negócio. A função do chef de cozinha é administrar o que acontece dentro da cozinha; não só os insumos que estão sendo transformados, mas os recursos humanos que estão transformando esses insumos. Grande parte dos 35% de restaurantes que sucumbem nos dois primeiros anos é por falta de gestão administrativa”, relata Lucas.
A prática
O ramo de alimentação fora de casa é um enorme mercado de trabalho para administradores, pois os processos envolvidos são grandes e suas regulamentações são complexas. O administrador Gabriel Martins, dono de um restaurante de sucesso em Vitória (ES), conversou com a RBA e contou um pouco mais sobre sua experiência. Apaixonado por gastronomia, abriu seu negócio depois de uma temporada nos Estados Unidos, onde trabalhou, inclusive, como chef de cozinha. Martins credita 50% do sucesso neste ramo ao trabalho de administração.
“Quando eu comecei, fazia basicamente tudo. Era o chef de cozinha e ‘contas a pagar’, passando pela compra de insumos. Mas as coisas começaram a crescer e é fundamental saber a hora de ampliar o negócio como um todo, não apenas o número de clientes e novos pratos”, ressalta.
Nos últimos dois anos, seu negócio passou a faturar o triplo. Absolutamente na contramão da economia brasileira, que sofre com seguidas retrações no mesmo período. E isso colocou Gabriel diante de um grande desafio: profissionalizar cada vez mais a gestão do seu negócio.
“Capacitação de recursos humanos foi o ponto de partida. Aqui, no Aloha, fazemos cursos de reciclagem com nossos 40 colaboradores a cada seis meses. Mesmo assim, estou me estruturando para montar uma área específica de RH, além de outros setores, porque pretendo, em 2019, expandir para outros estados e montar franquias. Para isso, mesmo sendo administrador, é muito provável que contrate outros [administradores] para os planos de expansão”, adiantou Martins.
Ele também deixou claro que as oportunidades para os administradores são grandes: “Um administrador pode administrar um restaurante como qualquer empresa. Mas são tantas regulações, que ele pode se especializar em determinados assuntos e oferecer consultorias específicas, como nas partes tributárias ou de logística. A mão de obra de administradores só tem a agregar ao mercado e ajudar a gerar cada vez mais receitas”, aposta Gabriel.
Carlos Peixoto é outro exemplo prático de como a Administração é fundamental para o sucesso dos negócios. Formado em Brasília, Peixoto tem em seu quase meio século de vida experiências em grandes franquias, como Pizza Hut e Mc Donald’s – da qual tocou a primeira operação de Brasília. Em um determinado momento, morando em São Paulo, decidiu que era hora de usar sua experiência – de vida e acadêmica – em prol do seu próprio negócio.
Montou um pub, que rapidamente se transformou em sucesso da noite paulistana. Passou o negócio alguns anos depois e retomou suas raízes, em Brasília, como proprietário, junto com um amigo de mais de 30 anos, de um wine bar, no Setor Sudoeste. Carlão, como é conhecido pelos amigos e clientes, diz que alguns dos fatores-chave de sucesso são investimentos no capital humano e no estreitamento do relacionamento com o cliente, ou a pessoalidade, como ele mesmo gosta de dizer.
“A ciência da Administração é muito importante em qualquer ambiente de negócios. Unindo este conhecimento à experiência que adquirimos ao longo da vida, no mercado, torna-se uma ferramenta poderosa que pode nos levar ao sucesso. Mas não podemos jamais esquecer que o capital humano ainda é o melhor dos investimentos, principalmente na prestação de serviços. Saber encaixar cada funcionário no lugar certo, oferecer sempre um ambiente de trabalho justo e cobrar na hora certa garante a satisfação de toda a equipe e, principalmente, do cliente final”, garante o administrador, líder de quatro funcionários em sua “Bodega”.
Do Brasil para o mundo
Que a culinária brasileira ganhou o globo é fato. A mais importante publicação do mundo no ramo, a The World’s 50 Best Restaurants 2018, organizada pela William Reed Business Media, elencou o restaurante do paulistano Alex Atala como um dos melhores do mundo em 2018. Além disso, o renomado Guia Michelin – responsável por eleger os melhores restaurantes do planetapor meio das famosas “estrelas Michelin”, premiou este ano nada menos que 18 casas no eixo Rio-São Paulo, confirmando que, de fato, o Brasil entrou no hall das melhores culinárias do mundo.