Prática retira o brilho do funcionário, não por sua falta de desempenho, mas por motivos e personagens alheios ao seu trabalho
Por Alexandra Fiori
Ter uma redução drástica das funções que exerce na empresa ou ser transferido para tarefas menos importantes, passando longe de suas competências. Essa é a prática do “ostracismo forçado”, o isolamento proposital imposto a um funcionário como forma de pressionar para que ele peça demissão.
A grande questão, neste caso, é saber que tipo de líder afasta seu liderado da produção diária. Isso tem consequências para a imagem da organização, para o desempenho da empresa e, ainda, para as finanças, diante de uma possível condenação trabalhista.
A prática do ostracismo evidencia uma falha de liderança, quer tenha sido adotada intencionalmente ou por insegurança no processo de gestão. A empresa pode ser responsabilizada por condutas abusivas e antiéticas, com consequências financeiras significativas, além de ser uma forma de exclusão que pode deteriorar a moral da equipe, criar um ambiente tóxico e aumentar a rotatividade de funcionários, comprometendo ainda mais a eficácia organizacional.
O doutor em administração e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Victor Martinez, lembra que o ostracismo não é algo novo – é muito comum contra mulheres que retornam da licença maternidade ou com funcionários próximos da aposentadoria. “A questão do pós-pandemia é que a relação homem-trabalho, homem no sentido humanidade, mudou bastante. O trabalho também mudou e não é mais garantia de estabilidade”, ressalta Martinez.
Insegurança pode ser uma das razões para um líder impor o ostracismo contra os seus liderados, afetando especialmente os cargos intermediários. Funcionários com potencialidades para promoção a cargos mais elevados correm o risco de encontrar lideranças que não aceitam profissionais com maior competência.
Segundo o professor Martinez, essa prática é comum em empresas familiares, principalmente quando a vítima tem um potencial ou resultados que podem intimidar pessoas que estão num cargo de chefia. O ciúme aconteceria quando líderes sentem que podem perder o cargo para pessoas que apresentam alto desempenho.
“O intuito do (verdadeiro) líder é pensar na organização como um espaço que visa o crescimento econômico, ele deve pensar na organização como um espaço em que recebe e tem garantias financeiras. Então, é um grande perigo para a empresa quando ela permite o ostracismo”, diz o doutor em administração.
Saúde Mental
Uma das consequências de ser colocado de lado para funções estratégicas da empresa é a redução da produtividade a partir da instabilidade emocional gerada pela situação. O funcionário fica desanimado, pois, em geral, faz atividades aquém de suas habilidades e percebe um ato intencional.
“É, sem dúvida, um tipo de assédio moral. Cria um ambiente tóxico e observável, pois as pessoas percebem e conversam umas com as outras”, diz Martinez.
Pesquisas apontam o ostracismo como um tipo de bullying (agressão e intimidação repetitiva contra um indivíduo que não é aceito por um grupo) ou pior que isso. Uma pesquisa da Universidade British Columbia, do Canadá, revelou que tal prática afeta mais o bem-estar e a saúde mental dos colaboradores do que aqueles que sofrem assédio moral no cotidiano, como piadas, apelidos maldosos e ridicularização.
Reclamação Trabalhista
O doutor em administração destaca que a reputação de uma empresa que quer mostrar um bom ambiente de trabalho, em casos de ostracismo, é realmente manchada e esse é um ponto que deve ser considerado. Por outro lado, há as consequências para além da imagem, como a condenação ao pagamento de indenização por danos morais ao funcionário e obrigação de reintegração ao cargo.
Mas como é possível saber se alguém está sendo vítima do “ostracismo forçado”? A advogada especialista em Direito do Trabalho, Zilda Ferreira, destaca que é difícil reunir provas para denunciar o ostracismo, por não ser algo visível, mas há alguns sinais que podem ser observados para identificar a prática.
“Quando existe a diminuição significativa das responsabilidades ou das tarefas do dia a dia, por exemplo. E quando ocorre exclusão de reuniões, projetos ou comunicações importantes e há ausência de feedback construtivo ou avaliações de desempenho”, revela Zilda.
A prática do ostracismo pode resultar em uma reclamação trabalhista, a chamada rescisão indireta. Embora por vezes seja complexa a comprovação do fenômeno, quando ela de fato ocorre, a prática é reiterada, ocorre por meses ou anos, e deixa evidências ao longo do período.
“Apesar do ‘ostracismo forçado’ não ser tipificado, a prática pode configurar desvio de função ou até assédio moral, dependendo do caso. É preciso documentar as mudanças de função ou comunicações que possam evidenciar a prática, ter testemunhas que possam comprovar os fatos alegados e formalizar a denúncia ao sindicato da categoria”, alerta Zilda.