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O que você faria se os impostos não existissem?

Com a reforma tributária em debate, a RBA convidou especialistas para debater o tema sob outro prisma. Entenda como seria e quais as consequências

Por Leon Santos

Com a promessa de ser votada ainda em 2023 no Congresso Nacional, a reforma tributária é um tema antigo que promete melhorias a diferentes setores da sociedade brasileira. Em meio a discussões midiáticas e políticas, o assunto ganhou as ruas e, não raro, é feita a seguinte questão que a RBA tentará responder: ‘e se os impostos não existissem?’

A mesma pergunta foi feita a especialistas, a fim de trazer conhecimento e uma ideia geral sobre o tema ao leitor. A explicação inclui desde explicações sobre ‘como’ e ‘por que’ surgiram os tributos, até as prioridades dos formatos praticados no Brasil e no exterior.

Segundo o economista e professor na Universidade de Brasília (UnB) Evilasio Salvador, o pagamento de tributos existe desde tempos imemoriáveis (não há registro específico do início da prática). Ele explica que, na prática, os impostos representam uma garantia de cidadania e são por meio deles que os indivíduos têm acesso a direitos nos campos social, político e econômico.

“É por meio da tributação que se organiza minimamente um convívio civilizatório na sociedade. Sem ele, seria impossível a convivência em sociedade, uma vez que o tributo organiza o fundo público e permite ao Estado financiar o modo de produção capitalista”, justifica.

Já o pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Octávio Valente, destaca que os impostos surgiram em um passado em que havia desigualdade de forças entre homens — com seus bandos e mais tarde exércitos. Isso gerou uma terceirização da proteção física e patrimonial que culminou no pagamento de imposto como forma de agradecimento.

Valente narra que ao longo do tempo os impostos proporcionaram aumento de poder dos homens mais fortes e protetores. Nesse contexto surgiu a aristocracia, na qual indivíduos arriscavam suas vidas para a proteção da propriedade privada de outras pessoas e isto resultou, mais tarde, na figura dos políticos.

“Se não houvesse a remuneração paga a esses homens para proteger a vida e propriedade alheia, acredito que não teríamos o desenvolvimento social proporcionado pela propriedade privada. A primeira função do Estado é a proteção física da vida, daí surge a segunda função, a proteção da propriedade privada”, destaca.

Fatos e comparações

Segundo Mauro Sayar, doutor em economia e professor da UFMG, se não houvesse o pagamento de impostos ao poder público não haveria, como exemplo, sistema de saúde e de educação públicos ou infraestrutura urbana, com ruas asfaltadas. Além disso, apenas famílias ricas teriam acesso à segurança, pois não haveria policiamento, nem existiriam juízes e cortes para aplicar a lei e arbitrar litígios.

É possível inferir, ainda, que grandes obras e construções feitas pelo homem — tais como templos, monumentos e cidades — não existiriam. Por isso, Sayar destaca a importância de ir direto ao cerne da questão que não é, para ele, o valor que se paga, mas sim quanto é coletado e se é revestido em benfeitoria ao contribuinte.

Segundo o pesquisador, as sociedades são taxadas de acordo com o tamanho dos gastos públicos e de seus governos em geral. Ele conta que há países que escolheram ter uma estrutura maior, pois acreditam que tal opção daria mais acesso a melhores serviços públicos, em áreas como saúde, educação e segurança.

“É provável que a maior parte da população de países cuja taxação é mais elevada, como na Noruega e Suécia, não se incomode em pagar muito imposto por perceberem elevado retorno, materializado na oferta de excelentes serviços públicos. No Brasil, embora a taxação seja muito elevada, se comparada à de países com o mesmo padrão de desenvolvimento, o Estado não consegue suprir com qualidade os serviços públicos em geral”, critica.

Modelo

Segundo o mestre em administração e especialista em administração econômica pela Universidade de Paris, Roberto Piscitelli, todos querem pagar menos impostos no país; no entanto, antes de qualquer mudança é preciso discutir qual será o modelo de Estado que os brasileiros desejam. Isso terá relação com o tamanho dos gastos, bem como das atribuições e serviços a serem oferecidos.

O pesquisador explica que embora exista imediata associação entre o que é pago e o retorno oferecido pelo Estado, é preciso pensar em como será a divisão equitativa — em faixas de cobrança de impostos, conforme a renda. Para Piscitelli, o orçamento público deve expressar condição compensatória tanto na captação (cobrança) quanto na destinação de recursos.

“A intenção de unificar as propostas em tramitação (PECs 45 e 110) e criar um imposto único é louvável, porém tem havido muita preocupação com a dimensão carga tributária e menos com prioridades como a promoção de justiça tributária. A reforma é fundamental, até em função do arcabouço fiscal a ser estabelecido, mas as consequências mexem no bolso de todos os brasileiros e são perenes (duradouras)”, sentencia. 

Essa é uma matéria da RBA ed. 153 – publicação do Conselho Federal de Administração (CFA).