Por Leon Santos
Cada vez mais organizações em todo o mundo incorporam a Semana Laboral de Quatro Dias como prática permanente. Após adesão de empresas de países como Emirados Árabes, Reino Unido, Espanha, Islândia e Japão, nos últimos meses têm sido realizados testes, também, nos Estados Unidos, Canadá e Brasil.
O novo modelo é chamado de ‘100 por 80 por 100’ (100% de salário, com trabalho em 80% do tempo e 100% de produtividade). De acordo com a ONG “4 Day Week” — organização incentivadora do modelo e que faz estudos sobre o assunto—, o resultado tem sido positivo.
Um exemplo vem do Reino Unido, onde segundo a ONG 92% das empresas que participaram do projeto decidiram manter o formato após os testes. Já entre os funcionários, 90% aderiram ao projeto e, como resultado, as organizações tiveram aumento de 35% em suas receitas.
No quesito saúde, as mesmas empresas apresentaram diminuição de 71% nos índices de Burnout (esgotamento físico e mental). Antes do projeto, 39% dos entrevistados relatavam se sentir estressados, não apenas com as atividades, mas também com o deslocamento ao trabalho.
No Brasil, a agência de comunicação Shoot adotou a prática em janeiro de 2022. Como resultado, obteve crescimento de mais de 300% de interesse nas vagas da empresa — após reduzir a semana para quatro dias e diminuir a carga horária de 8 horas para 6 horas diárias.
Percepção
Segundo a administradora especializada em Recursos Humanos Talita Oliveira, entre os benefícios obtidos com a nova prática estão o aumento do engajamento e da satisfação dos colaboradores, a atração e retenção de talentos, bem como o aumento da produtividade e criatividade. Ela destaca que ao experimentar uma semana de trabalho mais curta, os colaboradores passam a ter mais equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, além de melhorar sua percepção sobre a empresa.
“A organização que valoriza o bem-estar e a qualidade de vida de seus funcionários fortalece o vínculo emocional entre ela e seus colaboradores. Isso é percebido por eles, o que atrai e retém talentos; o tempo livre permite mais descanso e resulta em maior criatividade e inovação”, diz Talita.
A consultora em recursos humanos da empresa de recolocação ‘Lee Hecht Harrison (LHH)’ Caroline Reis explica que a ideia de reduzir a carga horária semanal de 40 horas para 32 horas teve como motivação o estado físico, mental e emocional dos colaboradores, sobretudo, após o fim do isolamento e no pós-pandemia. Ela defende o descanso proativo que consiste em incentivar os funcionários a tirarem um período de descanso antes mesmo de apresentarem sintomas de exaustão e estresse.
“O descanso proativo ajuda a prevenir problemas de saúde e a manter a produtividade alta. É uma forma de valorizar e cuidar dos funcionários, além de ser um atrativo na hora da contratação”, destacou.
Caroline conta que muitos profissionais qualificados têm optado por trabalhar em empresas que oferecem tais práticas, e que o novo comportamento pode representar um risco, no quesito rotatividade, às organizações que não adotam a medida. A administradora ressalta, ainda, que tais profissionais são justamente aqueles considerados imprescindíveis, ou difíceis de encontrar, o que pode dificultar a reposição e o exercício das funções (cargos em vacância), bem como na atração de novos talentos.
“A adoção de práticas como a ‘Semana de Quatro Dias’ e o ‘descanso proativo’ pode ser vista como um investimento de longo prazo, com foco na qualidade de vida dos funcionários, e resultar no sucesso da empresa”, avalia.
Benefício ou não?
Para o engenheiro de produção Victor Moreira, um dos pontos mais importantes da Semana Laboral de Quatro Dias é não apenas diminuir a ‘carga de trabalho indispensável’, mas também reduzir aquelas que são desnecessárias. Com menos dias, as empresas seriam obrigadas a reduzir reuniões, automatizar processos e focar em dar mais autonomia aos trabalhos de cada colaborador.
O novo regime de trabalho também favorece a forma como os colaboradores enxergam o trabalho, uma vez que ter maior autonomia gera um ambiente de confiança mútua entre empregado e empregador. Ele ressalta, no entanto, que as duas partes precisam ter em mente que tal sistema não é uma oferta de benefício.
“Na verdade, deve ser encarada como um acordo mútuo: em que ambas as partes alinham seus resultados e demandas à alteração do arranjo de ‘foco em horas trabalhadas’ para a medição de resultados. Ou seja, tanto o colaborador quanto a empresa têm papéis e deveres a cumprir nesse processo”, esclarece.
Greenwashing
Em tempos de Greenwashing, o dia não trabalhado pode se tornar uma espécie de home office, em razão da quantidade excessiva de atividades que o funcionário terá de realizar, antes e depois do dia parado, o que o levaria a trabalhar mesmo quando deveria descansar. Aplicado ao universo ESG — sigla inglesa que representa boas práticas nos quesitos ambientais, sociais e de governança corporativa —, o greenwashing acontece quando uma empresa mascara ações de ESG para se autopromover.
Segundo a administradora Talita Oliveira, muitos de seus mentorados de carreira relatam que são acionados fora do horário de trabalho e, por vezes, são cobrados por entrega de projetos em prazos apertados e infactíveis. O resultado culmina em transtorno de ansiedade, pânico e burnout — práticas contrárias ao que pregam o ESG e a ‘Semana Laboral de Quatro Dias’.
“Para evitar o Greenwashing é essencial que as empresas atuem de acordo com os princípios de responsabilidade social e promovam, de maneira genuína, qualidade de vida e bem-estar de seus funcionários. Transparência nas ações, comunicação clara e adoção de práticas consistentes são elementos fundamentais para evitar qualquer forma de falsa representação ou engano nas práticas de trabalho”, sentenciou.