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Guerras pelo mundo podem favorecer economia brasileira

Embora representem retrocessos civilizatórios, guerras abrem espaço para o Brasil como player em nichos de mercado globais

Por Leon Santos

O mundo vive atualmente pelo menos duas grandes guerras: entre Rússia e Ucrânia, entre Israel e Palestina e outros tantos conflitos. Como isso já não bastasse, por outro lado ainda há tensões comerciais entre China e Estados Unidos, e a polêmica envolvendo Taiwan — território do qual os chineses reclamam a posse.

Diante de tantas tensões, fica a pergunta: como fica o Brasil em meio a tudo isso? Afinal, a globalização interligou os países em suas economias, culturas e aumentou a dependência mútua em diversos quesitos.

Segundo o professor da PUC Minas, Ricardo Ghizi, além do fator humano e social, as guerras prejudicam as economias em todo o mundo, pois reduz a oferta de alimentos, de bens industrializados e serviços por parte dos países em litígio. Outro fator que prejudica a economia mundial são os efeitos diretos no comércio internacional, com o aumento do seguro de transporte de mercadorias, bem como do frete marítimo nas regiões do entorno dos conflitos.

“Essa redução na oferta, muitas vezes de bens de primeira necessidade, gera aumento de preços em escala global, acarretando aumento da inflação em todo o mundo. Quanto mais internacionalizada for a economia de um país, ou seja, quanto mais dependente de importações, mais o país sentirá os efeitos do aumento de preços e da inflação interna”, explica Ghizi.

Repercussão

O conflito entre Rússia e Ucrânia retraiu a oferta internacional de insumos agrícolas, o que afetou em demasia o Brasil, uma vez que boa parte do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro vem do agronegócio. Segundo o pesquisador Sandro Maskio, da Universidade Metodista de São Paulo, a diminuição da oferta dos insumos agrícolas foi um elemento de pressão para o aumento dos preços de alimentos no mundo: em 2023 eles ficaram 20% acima do observado em 2020, segundo o índice ‘FAO Food Price Index’ da Organização das Nações Unidas (ONU).

“Em certa medida, esse aumento tem sido mascarado pelo pico de elevação dos preços dos alimentos observados em 2021 e 2022. Ou seja, foram influenciados pelas restrições à produção e ao fluxo de mercadorias nos períodos mais severos da pandemia”, destacou.

O conflito entre Rússia e Ucrânia também afetou o preço do gás e do petróleo. Esse último chegou a US$122 o barril, em abril de 2022, no auge da guerra, mas depois recuou para cerca de US$85 em 2023, valor ainda assim superior ao observado no período entre 2015 e 2020 antes da pandemia.

A redução do ritmo de crescimento da economia mundial também tem contribuído para haver menor demanda por petróleo, o que ameniza o aumento do preço do barril no mercado internacional. Por outro lado, o aumento da inflação, em todo o mundo, tem provocado o aumento da taxa de juros na maioria dos países, efeito que vai na contramão do ritmo de crescimento econômico.

Horizonte

Para Maskio, o modelo de produção offshore, efeito da globalização, parece ter demonstrado todo seu potencial em termos econômicos. Por isso, as nações têm buscado construir um novo modelo de organização e distribuição produtiva que minimize riscos, semelhantes aos enfrentados recentemente na pandemia.

O objetivo é garantir maior resiliência não só das economias nacionais, como também nos resultados dos grandes grupos econômicos de atuação internacional. “Nessa esteira, a construção de cadeias produtivas mais regionalizadas tem mostrado alguma força. O nearshoring cria oportunidades de negócios entre países, como se observa no México, atrelado ao esforço de retomada da atividade econômica e fortalecimento produtivo de parceiros como os EUA”, exemplifica.

Já para Ricardo Ghizi, conflitos como o da Ucrânia abrem possibilidades de o Brasil investir na produção interna de insumos agrícolas e de outros produtos cujas guerras impedem a fabricação ou circulação. Mas, para tanto, o país precisa de políticas públicas que incentivem a criação de indústrias, assim como a redução de tributos na produção e o financiamento de empresas que decidirem investir em tais nichos da economia.

“É importante lembrar que temos uma instituição de renome internacional, a Embrapa, que talvez possa dar sua contribuição na criação desse novo mercado de insumos agrícolas. Além disso, é preciso ter a compreensão da necessidade de termos um projeto de desenvolvimento de país, bem como investimentos estruturantes (em infraestrutura) e reconhecer que projetos desta magnitude geram resultado a médio e longo prazo”, conclui.