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Publicidade inusitada – marcas entram no bonde dos funkeiros e angariam fãs

Por Leon Santos

A menção de marcas de luxo em letras de funk tem chamado atenção de fãs de artistas, das marcas citadas e do público em geral que observa com surpresa a publicidade gratuita. A Lacoste foi uma das marcas contempladas e que decidiu entrar na onda.

Chamada de “Lalá” em algumas das músicas, a Lacoste realizou ação de marketing e mudou temporariamente o nome de algumas de suas lojas ao adotar o apelido dado pelos músicos. A marca também chamou alguns dos funkeiros que a mencionam, e usam suas roupas, para ações de ativações, shows e bate-papos — transformando suas lojas em espaços de cultura e lazer.

Na visão de especialistas, a iniciativa fez com que os consumidores se sentissem intimamente ligados à marca e a Lacoste se adaptasse ao cenário da cultura nacional. Edições especiais de produtos também foram lançadas, junto com ações de marketing, com a finalidade de transmitir senso de pertencimento aos consumidores brasileiros, o que consolidou um desejo da marca de se envolver ativamente com novos públicos e manter seus atuais clientes.

Segundo a professora de pós-graduação em ‘Serviços e Marketing de Luxo’ da ESPM, Andréia Meneguete, o fenômeno mostra como a cultura periférica tem ocupado novos espaços e dialogado com o público da ‘classe A’. Para ela, a estratégia da Lacoste está em impactar novos consumidores diante da mediação da mensagem dos funkeiros.

Meneguete conta como funciona a indústria de luxo. Ela diz que o segmento trabalha com foco no desejo de um consumidor específico, extremamente exigente, que almeja construir sua identidade por meio de códigos dos quais as marcas que ele consome também compartilham.

“Com preço elevado, essas marcas trazem esses valores para um consumidor cada vez mais exigente que busca satisfazer seus desejos e construir essa diferenciação e construção de uma nova identidade”, revela.

Posicionamento

Segundo o doutor em administração e professor nos cursos de graduação e pós-graduação da PUC-RJ e do Ibmec, Rafael Guimarães, o fenômeno de associar a própria imagem às marcas tem nome e se chama “self-brand connection”. O tema tem ganhado espaço na literatura de marketing, ao associar reconhecimento social, distinção, status e conquistas individuais a traços presentes nas marcas de luxo, agora incorporadas por seus consumidores.

Guimarães explica que esse público tende a associar sua identidade às marcas consumidas, o que resulta em fenômeno denominado “marca como self”. Ele explica que existem autores que consideram o consumo de luxo como uma forma de construção e comunicação da identidade de um indivíduo.

“As pessoas podem consumir marcas de luxo simplesmente porque isso representaria seus valores e crenças. Ou também por que refletiria determinada imagem social que eles eventualmente desejam transmitir ou, em última instância, ambas as coisas”, explica.

Embora o posicionamento da Lacoste ainda não tenha sido colocado em cheque, Guimarães ressalta o cuidado que as organizações devem ter, seja na identificação correta de seu público-alvo ou persona, ou na comunicação clara de sua proposta. Perguntado sobre o que aconteceria caso a marca não se manifestasse após a publicidade gratuita, ele ressalta que seria um erro ignorar tal oportunidade.

Para o especialista, caso tais marcas quisessem por alguma razão desconsiderar o ou ignorar a preferência dos funkeiros, isso não seria possível. “Poderia até repercutir de forma bastante negativa junto ao mercado, aos demais stakeholders e, por óbvio, nos resultados das respectivas organizações”, destaca Guimarães.

Oportunidade

O fenômeno de posicionamento utilizando marcas de grife ou de luxo não é exclusividade da Lacoste — marca que teve crescimento notável, com aumento de 26% (2,5 bilhões de euros) em receita no mundo, com 60% dele na América Latina. Outras marcas que “entraram no bonde” foram a Nike, Adidas e a Oakley com seus óculos Juliet.

Segundo o CEO da Lacoste para América Latina, Pedro Zannoni, em entrevista ao jornal Valor Econômico, a marca abraçou as mudanças bem como a geração Z (pessoas nascidas entre 1995 e 2010). Ele cita como exemplo as ações da empresa para se posicionar como multicultural, sem perder sua essência e elegância.

“A Lacoste é muito querida pelo público lacosteiro, e foi pensando nisso que criamos um cenário conectado com sua identidade cultural. Entendemos que é essencial ter um espaço totalmente interativo para nos conectarmos e trocarmos experiências com os fãs da marca”, disse.